Definição
Atividade de pressão, exercida por grupos de interesses, que objetiva influenciar as tomadas de decisões políticas e administrativas para obtenção de suas pretensões, porém sem o comando ou controle direto das atividades governamentais.
Aspectos distintivos
A palavra lobby tem ascendência inglesa, que originalmente refere-se ao hall ou salão de entrada de uma construção. Por essa mesma razão, o termo passou a englobar um significado político social, sendo usado para definir a ação de indivíduos que aguardavam a passagem de agentes governamentais e tomadores de decisões de políticas públicas e privadas nos lobbies de hotéis ou de seus locais de trabalho, na tentativa de abordá-los buscando uma oportunidade de pautar suas reivindicações e interesses, com o propósito de influenciar as decisões destes agentes.
Nos Estados Unidos da América, o surgimento do lobby é atrelado ao Presidente da República Ulysses S. Grant (1869-1877), que tinha como costume fumar charutos no lobby do Hotel Willard e receber grupos ou cidadãos interessados em explanarem suas pautas, para que as tomadas de decisões no seu mandato pudessem ter participação popular. Apenas em meados de 1946 esta atividade foi regulamentada nos EUA, através da Federal Regulation off Lobbing Act, dispositivo legal que buscava inibir atos corruptos ou arbitrários, através da transparência fiscal dos lobistas e de registros de suas atividades realizadas no âmbito federal, ou seja, pela exposição de agendas de reunião e pautas tratadas com os agentes federais. Porém, tal lei não se provou eficaz, sendo criada e aprovada, no ano de 1995 uma segunda lei em substituição da anterior, conhecida como Lobbing Disclosure Act. Sua principal alteração, em relação à primeira, foi a exigência do registro de atividades e transparência financeira para atividades de todos os âmbitos, desta vez, não limitando-se então apenas ao âmbito federal.
Na União Europeia, sua regulamentação se dá por meio do registro dos lobistas profissionais, de forma não obrigatória, juntamente com um código de ética, o que garante fiscalização dos lobistas atuantes por um órgão responsável.
Já no Chile, a regulamentação ocorreu em 2014 e exige que as declarações sejam realizadas pelos agentes tomadores de decisão do governo. Ou seja, o agente governamental deve possuir transparência em sua agenda, devendo manter sempre público com quem se reúne e quais pautas estão sendo tratadas. Essa exigência aplica-se para quaisquer reuniões, seja com grupos civis ou com instituições em geral.
Apesar de há quase quatro décadas tramitarem diversos projetos de lei para a regulamentação da atividade, não existe até o momento dispositivo legal no Brasil que trate diretamente deste tema. O PLS nº 203/1989 – do senador e ex-Vice-Presidente da República Marco Maciel – foi aprovado no Senado, mas nunca foi colocado para votação na Câmara dos Deputados, motivo pela qual foi posteriormente arquivado em virtude da ausência de movimentação. Outro projeto de lei conhecido por tratar de tal matéria tramita na Câmara dos Deputados: o PL nº 1202/2007, de autoria do deputado Carlos Zarattini aguarda deliberação no plenário desde 2012.
A inexistência de ordenamento jurídico que trate de tal matéria em nosso país, tem causado profunda insegurança e rejeição à atividade, resultando em uma obscura e fosca diferenciação do que é lícito e ilícito no lobby, fazendo com que muitas vezes acabe por ser equiparado a crimes de corrupção, tráfico de influência ou outros delitos de colarinho-branco.
Análise
Em um país como o Brasil, o lobby é intrínseco à administração pública. Retrato disso é a estruturação da Constituição Federal (1988); entre 1986 e 1987 diversos grupos civis, sindicatos e demais congregações organizadas, reuniram-se para manifestar seus anseios, momento em que foram enviados aos deputados constituintes aproximadamente 72 mil sugestões, as quais foram analisadas e posteriormente exerceram influência na produção do texto constitucional – fato que deixa a Constituição de 1988 popularmente conhecida como "Constituição Cidadã". Exemplo de que o lobby foi de suma importância na elaboração da Constituinte brasileira de 1988, a partir da consideração das pautas de diversos grupos lobistas, foi o papel desempenhado pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP), fundado em 1983, tendo como principal objetivo atuar com atividades de influência democrática nas decisões dos Poderes da República. Ficando conhecido por sua forte atuação na representação dos pleitos da classe trabalhadora de diversos sindicatos até os dias atuais, suas atividades de influência durante a produção da Constituinte de 1988 são consideradas um marco.
De antemão, é de extrema importância fixar a ideia de que lobby carrega consigo um significado neutro; e que por si só não possui licitude ou ilicitude e que o fator determinante para tal classificação será medido a partir do cumprimento ou não das leis e do ordenamento jurídico como um todo.
Os lobbies lícitos, aqueles que acatam o ordenamento jurídico, podem contribuir de forma muito favorável à sociedade, quando usado por exemplo: na defesa de direitos sociais, desenvolvimento sustentável, geração de renda, combate à corrupção etc., visando atender sempre os interesses coletivos. É comum que os tomadores de decisões políticas e governamentais, deparem-se com questões demasiadamente complexas, de maneira que se torna extremamente frágil realizar a tomada de decisão apenas com suas crenças singulares; muitas vezes sendo necessário a participação da sociedade e de seus representantes para deliberação de tais questões.
É prudente ressaltar que, em determinada pauta podem existir diversos lobistas defendendo seus interesses e estes serem diversos, inclusive, opostos. Isso torna muito valiosa cada apresentação de dados, informações, anseios e opiniões que esses lobistas representam ou das pessoas que sejam afetadas pelas pautas a serem deliberadas por tais agentes.
Por outro lado, se é verdade que a valoração do lobby se dá por seus meios e fins, o lobby ilícito pode desencadear crimes contra a Administração Pública. Além disso, outro problema consequente dessa atividade é o desequilíbrio de influência, que por muitas vezes gera problemas sociais graves. Como ilustração, pensemos na indústria agropecuária, um dos maiores grupos de pressão no lobismo brasileiro, representada por uma bancada no Congresso Nacional, conhecida como a Frente Parlamentar da Agropecuária (FAP) – o que a torna um lobby institucionalizado. Ainda que a existência dessa Frente não caracterize por si um ilícito, ela tem contribuído com desfavores irreparáveis à sociedade brasileira, como por exemplo, as queimadas na Amazônia, floresta tropical que perdeu cerca de 44 milhões de hectares diretamente para a agropecuária em aproximadamente apenas três décadas.
O grande desafio do país, neste ponto, é estruturar e fomentar o lobby lícito, como exercício de representatividade democrática, e combater o lobby ilícito, aquele que configura uma discrepância de interesses ou benefícios à sociedade ou a grupos vulneráveis, levando-se em conta fatores de sustentabilidade, de economia e de relações humanas.
Referências bibliográficas
CAMPOS, Juliana Isac. Lobby e parlamento: estudo de caso da atuação da assessoria de relações governamentais da FIESP no Congresso Nacional brasileiro. Orientador: Nivaldo Adão Ferreira Júnior. Centro de Formação, Treinamento e Aperfeiçoamento da Câmara dos Deputados (Especialização em Poder Legislativo) Monografia. 57 fls. Brasília, 2017.
CARVALHO, Fagner dos Santos. O Papel dos Grupos de Interesse e Pressão na Formatação e Fortalecimento da Democracia Brasileira: O Caso do Departamento Intersindical Assessoria Parlamentar (DIAP) Durante o Processo da Constituinte (1987/1988) Brasileira. Revista Aurora. UNESP. v. 3. n.1 (2009). São Paulo: 02 dez. 2009. Disponível em: https://doi.org/10.36311/1982-8004.2009.v3n1.1217. Acesso em: 08 mar. 2022. ISSN 1982-8004.
GOZETTO, A. C. Oliveira. Breve Histórico Sobre o Desenvolvimento do Lobbying no Brasil. Revista de Informação Legislativa. v. 42. n. 168. pp. 29 - 43. Brasília: 0ut/dez. 2005. Disponível em: http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/928. Acesso em: 08 mar. 2022.
MANCUSO, Wagner Pralon; GOZETTO, Andréa Cristina Oliveira. Lobby e políticas públicas no Brasil. Colóquio internacional: Analyser les Politiques Publiques Brésiliennes. Institut des Amériques. Paris: 5 e 6 jul. 2012.
PILAU, Lucas e Silva Batista. Colarinho-branco. In.: FRANÇA, Leandro Ayres (coord.); QUEVEDO, Jéssica Veleda; ABREU, Carlos A F de (orgs.). Dicionário Criminológico. Porto Alegre: Editora Canal de Ciências Criminais, 2020.
Referências artísticas
O Super Lobista (George Hickenlooper, 2010)
Filme
Jack Ambroff, personagem principal da trama, é um lobista de grande influência em Washington, conhecido por representar os interesses, principalmente, de donos de cassino. O personagem é responsável também, por ajudar inúmeros senadores a alcançarem suas reeleições; estes por consequência e como forma recompensa à Jack, acabavam por legislar em favor do protagonista e seus clientes. Além disso, uma segunda problemática é exposta e se dá quando o personagem é acusado de corrupção e assassinato. Ante a isso, busca utilizar de sua influência, para o atingimento de seus interesses pessoais para salvar sua reputação e livrar-se das acusações.
Thank You for Smoking (Jason Reitman, 2006)
Filme
Baseado em um livro com o mesmo nome, Thank You for Smoking utiliza do humor e do sarcasmo, para realizar uma crítica política e aos lobistas, que por muitas vezes, acabam exercendo sua influência de maneira dissimulada. A produção tem como protagonista, Nick Naylor, um lobista da indústria do tabaco, que está disposto a usar de qualquer estratégia, inclusive de métodos traiçoeiros, para atingir os interesses da indústria tabagista. Nick tem como tática reproduzir uma argumentação ardilosa, através do questionamento de dados, metodologias de pesquisa etc., mesmo ciente de que não há benefício algum no consumo de cigarro, o personagem se monstra incansável no atingimento de seus objetivos, por puro interesse financeiro.
Lobby desvendado:Democracia, políticas públicas e corrupção no Brasil contemporâneo (Milton Seligman e Fernando Mello, 2018)
Livro
Com viés acadêmico, o livro tem como objetivo desmitificar o lobby e desassociá-lo de práticas ilícitas ou imorais, apoiando-se em artigos que discorrem sobre a história e a importância desta atividade em uma democracia. Os autores realizam análises da possível relação do lobby no Brasil com corrupção, do contexto político polarizado e as consequências que resultam desinformação. Em contraponto, argumentam alguns modelos de regulamentação da atividade em nosso país, visando o exercício de influência ético, que objetivem, principalmente, atender objetivos benéficos e de interesse social.
Júlia Pereira Silveira
Lattes | ORCID
SILVEIRA, Júlia Pereira. Lobby. In.: FRANÇA, Leandro Ayres (coord.); QUEVEDO, Jéssica Veleda; ABREU, Carlos A F de (orgs.). Dicionário Criminológico. 3. ed. Porto Alegre: Editora Canal de Ciências Criminais, 2022. Disponível em: https://www.crimlab.com/dicionario-criminologico/lobby/108. ISBN 978-65-87298-14-6.